Trans-humanismo — O que é
Transumanismo ou trans-humanismo (às vezes simbolizado por >H ou H+) é uma filosofia emergente que analisa e incentiva o uso da ciência e da tecnologia, especialmente da biotecnologia, da neurotecnologia e da nanotecnologia, para superar as limitações humanas (intelectuais, físicas e psicológicas), e, assim, poder melhorar a própria condição humana.
Transumanistas estudam os benefícios e perigos potenciais das tecnologias emergentes que poderiam superar as limitações fundamentais humanas, assim como as implicações éticas envolvidas em desenvolver e usar tais tecnologias.
A imortalidade não seria fruto de uma única invenção ou descoberta, mas um desenvolvimento contínuo da tecnologia relacionada à saúde e a medicina, fazendo a expectativa de vida tender a subir exponencialmente a ponto de considerar que o ser humano não irá mais morrer por conta de velhice.3
O termo transumanismo foi criado pelo biólogo Julian Huxley em 1957, que o definiu como a doutrina do “homem continuando homem, mas transcendendo, ao perceber novas possibilidades de e para sua natureza humana”. Essa definição, conquanto historicamente originária, não é a mais usada, que dela difere significantemente.
Em 1966, FM-2030 (antes F.M. Esfandiary), um futurista estadunidense da New School University, começou a identificar como “trans-humano” (uma referência a “humano transitório”) — seriam pessoas que adaptavam tecnologias, estilos de vida, e visões de mundo transicionais à uma pós-humanidade.
A caracterização atual do termo, porém, deve-se a Max More. Em suas palavras, “O transumanismo é a classe de filosofias que buscam nos guiar a uma condição pós-humana. Ele inclui muitos elementos do humanismo, como o respeito pela razão e pela ciência, o compromisso pelo progresso, e a valorização da existência humana (ou transumana) na vida[…], mas difere no reconhecimento e na antecipação de alterações radicais na natureza e nas possibilidades de nossas vidas, resultando de várias ciências e tecnologias[…].”
Anders Sandberg descreve o transumanismo moderno como “a filosofia que diz que podemos e devemos nos desenvolver a níveis maiores, seja fisicamente, mentalmente ou socialmente, usando métodos racionais”, enquanto Robin Hanson o descreve como “a ideia de que, de vários modos, nossos descendentes não irão ser considerados ‘humanos’.”
Alguns dos objetivos comuns aos trans-humanistas são o aumento da inteligência humana e o prolongamento indefinido do tempo de vida do ser humano através das tecnologias para eliminação do envelhecimento, visando a imortalidade.
Singularidade — O que é
Singularidade tecnológica é a denominação dada a um evento histórico previsto para o futuro, no qual a humanidade atravessará um estágio de colossal avanço tecnológico em um curtíssimo espaço de tempo1 , onde a inteligência artificial terá superado a inteligência humana, alterando radicalmente a civilização e a natureza humana.
Baseando-se em avanços nas áreas da informática, inteligência artificial, medicina, astronomia, nanotecnologia, genética e biotecnologia, muitos estudiosos acreditam que nas próximas décadas a humanidade irá atravessar a singularidade tecnológica e é impossível prever o que acontecerá depois deste período.
A aceleração do progresso científico e tecnológico tornou-se, nos últimos 300 anos, a característica mais marcante da história da humanidade. Desde o surgimento da ciência com Galileu Galilei, Isaac Newton e Leibniz profundas mudanças políticas e econômicas ocorreram em todos os países. Tais mudanças se fazem mais notáveis nos últimos 30 anos com a explosão da era digital e do capitalismo financeiro.
Ainda não existe consenso sobre quais seriam os agentes responsáveis pela singularidade tecnológica. Alguns acreditam que ela decorrerá naturalmente, como consequência dos acelerados avanços científicos. Outros acreditam que o surgimento iminente de supercomputadores dotados da chamada superinteligência será a base de tais avanços – argumenta-se em favor disso que somente com uma inteligência superior à humana poderíamos ter avanços científicos e tecnológicos tão rápidos e importantes.
Há também quem acredite na integração homem-computador para o surgimento da superinteligência, mas a tecnologia necessária para tal pode estar mais distante de ser alcançada do que a inteligência artificial.
Vários cientistas, entre eles Vernor Vinge (a quem é creditada a criação do termo1 ) e Raymond Kurzweil, assim como alguns filósofos, afirmam que a singularidade tecnológica é um evento histórico de importância semelhante ao aparecimento da inteligência humana na Terra. Outros, mais levianos, afirmam que a singularidade tecnológica é para o século XXI o que a revolução industrial foi para o século XVIII ou simplesmente que a singularidade tecnológica é, na verdade, a quarta revolução industrial.
Para fazer uma estimativa precisa de quando exatamente a inteligência artificial conseguirá alcançar níveis superiores à inteligência humana muitos índices tem sido usados e comparados. A lei de Moore, em vigor há mais de 30 anos, segundo a qual a cada 18 meses a capacidade de processamento dos computadores dobra, enquanto os custos permanecem constantes, é extensamente usada como modelo nos estudos sobre singularidade tecnológica.
No modelo de singularidade tecnológica como consequência natural do acelerado progresso técnico-científico, vários outros índices também têm sido utilizados. Dentre eles podemos destacar: o número crescente de publicações científicas anuais, o número crescente de patentes registradas e a crescente concorrência econômica e industrial internacional.
A maior parte daqueles que pesquisam ou discutem a singularidade tecnológica acreditam que esta possa decorrer entre os anos de 2025 e 2070, embora seja perfeitamente possível que esta demore mais a ocorrer ou, simplesmente, não ocorra.
Em 2011, Kurzweil observou tendências existentes e concluiu que a singularidade estava se tornando mais provável de ocorrer em torno de 2045. Ele disse à revista Time: “Vamos fazer com sucesso a engenharia reversa do cérebro humano em meados dos anos 2020. No final dessa década, os computadores terão inteligência no mesmo nível humano.”
Perigos potenciais
Existe atualmente uma complexa discussão sobre os perigos que a singularidade tecnológica poderá trazer à humanidade.
Segundo muitos estudiosos, um intelecto artificial muito superior aos melhores cérebros humanos em praticamente todas as áreas, incluindo criatividade científica, sabedoria geral e habilidade social, não teria porquê estar submisso a nós.
De acordo com esta linha de raciocínio, Vernor Vinge aposta na rebelião das máquinas inteligentes contra os homens, o que poderia resultar em um extermínio total ou na escravização da raça humana após uma guerra de grandes proporções, muitas vezes apontada como uma possível Terceira Guerra Mundial. Ao lado de Vernor Vinge, temos também Bill Joy, fundador da Sun Microsystems, que publicou no ano 2000 o atualmente famoso artigo “Por que o futuro não precisa de nós?”, onde defende a ideia de que as máquinas inteligentes e auto-replicantes são perigosas demais e poderão facilmente fugir do nosso controle.
Tradicionalmente argumenta-se que os homens jamais iriam entregar o poder às máquinas ou dar-lhes a capacidade de tomá-lo de nós, mas as coisas podem se suceder de forma diferente, já que o grau de dependência do homem aumentará paulatinamente até chegar a um ponto em que não restem alternativas senão a de aceitar as decisões tomadas pelas máquinas.
Na mesma proporção em que os problemas da sociedade se tornarem mais complexos e as máquinas mais inteligentes, cada vez mais decisões serão tomadas por elas simplesmente por serem mais eficazes que as tomadas pelos humanos. Isso pode levar a um estágio em que a nossa dependência em relação às máquinas transforme-se no domínio pacífico das mesmas sobre nós, o que não descarta a possibilidade de um domínio agressivo.
Numa linha de raciocínio alternativa, o matemático, escritor e ativista político Theodore Kaczynski, conhecido como o terrorista Unabomber, publicou um manifesto sobre a possibilidade das classes superiores da sociedade usarem-se da tecnologia para simplesmente eliminar as massas inferiores. Kaczynski é também adepto do ludismo e é radicalmente contra o avanço tecnológico da forma como ele está acontecendo. Os artigos de Kaczynski foram incluídos em um livro recente de Raymond Kurzweil.
Outros perigos mais amenos dizem respeito a exclusão digital e social e ao impacto da singularidade tecnológica sobre a economia internacional, especialmente sobre os países pobres e emergentes.
Há ainda questões éticas, como sob qual uso os equipamentos de realidade virtual serão usados pelo homem. Bill Gates afirmou em seu livro The Road Ahead (A Estrada do Futuro) que uma roupa com tecidos hipersensíveis poderia ser usada para simular sexo com o auxílio de um óculos de realidade virtual, o que levantaria questões polêmicas.
Ele ainda prevê que num futuro ainda mais distante robôs poderiam ser usados de forma extremamente realista para o ato sexual e humanos poderiam aderir em massa, deixando de ter filhos e de se engajar em relacionamentos reais, diminuindo exponencialmente a população do planeta e tornando ainda mais fácil o domínio das máquinas em relação ao homem.
O fator mais indicativo desse processo é a observação do vício na utilização da Internet e os sintomas que mundos virtuais causam em pessoas propensas ao vício, como isolamento social intenso, negligência quanto a alimentação e saúde, sedentarismo e perda de contato com a realidade.
Imortalismo
Imortalismo é o sistema de crenças, com base no desejo de escapar da morte física, ou pelo menos tanto quanto possível adiá-la. Muitas vezes usado como sinônimo de uma filosofia imortalista. Pesquisa para a vida eterna, a busca da imortalidade – uma das mais profundas aspirações humanas, antecipando trans-humanismo por milhares de anos. Esta pesquisa está no coração da maioria dos ensinamentos religiosos e é um tema importante da cultura mundial.
Deve-se distinguir entre imortalismo científico e imortalismo esotérico. São radicalmente diferentes um do outro, em termos e métodos de alcançar a meta. O Imortalismo Científico é um sistema de crenças baseado num desejo de adiar a morte física para sempre, com base na realização de ciências exactas, naturais e engenharia. É uma parte importante da pesquisa do trans-humanismo.
Segundo um levantamento, realizado entre os cientistas dos EUA em 1997, 50% deles acreditam na possibilidade da imortalidade pessoal da pessoa (neste caso, apenas 40% dos entrevistados se identificaram como pessoas religiosas)1 . Imortalidade, juntamente com a criação de máquinas de inteligência artificial e a resolução dos problemas da viagem interestelar, é considerada uma das metas de longo prazo importantes das Ciências aplicadas.
[Até aqui, extos extraídos da Wikipédia, a enciclopédia livre.]Bem-vindo ao trans-humanismo! [Defesa da idéia, publicada na Folha de S.Paulo]
Como definir um ser humano? É o corpo? O jeito de ser? A capacidade autorreflexão, de compaixão? A mente? Talvez todas essas coisas e outras mais? O que parece óbvio para maioria das pessoas vai ficar cada vez menos, com o avanço da nossa relação cada vez mais simbiótica com aparelhos e instrumentos.
Trans-humanismo é definido como a possibilidade de a raça humana evoluir além de suas limitações mentais e físicas, especialmente através da intervenção da ciência e da tecnologia. Pode parecer coisa de ficção científica: pessoas com asas violetas, ou capazes de levantar um carro com uma mão, ou com uma memória prodigiosa. Se sua definição do que é ser humano é purista, ou seja, sem intervenção de fontes externas, é bom abrir os olhos: quase ninguém mais é.
Tomemos, por exemplo, os remédios. Se tomamos um remédio que muda nossa química, por exemplo, se temos depressão ou pressão alta, já não somos os mesmos. Somos produto de quem éramos mais o remédio. O trans-humanismo não aparece apenas no cinema, serve também para aliviar o sofrimento humano. Para muitos, essa é sua maior motivação. A apropriação pelo corpo da química farmacêutica muda nossa natureza. Mesmo vitaminas, fazem a mesma coisa, mudando nossos corpos para termos um sistema imunológico mais resistente, ou mais energia etc.
E quando começamos a adicionar partes extras, ou próteses? Um atleta paraolímpico, se tem pernas feitas de fibras de carbono, deve competir com atletas normais? Nas últimas Olimpíadas, o sul-africano Oscar Pistorius, hoje acusado de assassinato, fez parte do time de seu país. E se tivesse ganhado? Teria sido justo?
O ponto é que estamos já na era do trans-humanismo. Quem não toma remédios ou vitaminas certamente tem um celular. Esse aparelho é uma extensão de quem somos, que se tornou indispensável no cotidiano. Difícil imaginar que, não tanto tempo atrás, ninguém tinha celular. Esquecer o seu em casa é trágico, certo? É ficar desconectado, sem memória, sem calendário, sem notícias, sem email, sem mapas, sem música, GPS etc. Todos esses aplicativos são extensões de nossas faculdades mentais, parte de quem somos, de como nos definimos. Não entrar no Facebook ou no Twitter é se desligar da realidade.
Isso porque nossa realidade também é trans-humana. Vivemos na era da informação de rápido acesso, conectaos por vídeo com pessoas do outro lado do planeta, algo que para nossos avós seria magia negra. Estendemos nossa teia por todo o planeta e temos acesso à quantidades inimagináveis de dados. Nosso cérebro não é mais apenas o que está dentro do crânio, ele espalha seus tentáculos pelo mundo inteiro.
E no futuro? A tendência será trans-humanizar cada vez mais. E ficar menos humano. O que temos que mudar num indivíduo para que deixe de ser humano? Ou será que, com o avanço do trans-humanismo, essas perguntas não farão mais sentido? Seremos algo de novo, nos reinventando enquanto espécie.
Marcelo Gleiser é professor de física e astronomia do Dartmouth College, em Hanover (EUA). É vencedor de dois prêmios Jabuti e autor, mais recentemente, de ‘Criação Imperfeita’. Escreve aos domingos na Folha de S.Paulo
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/marcelogleiser/2014/06/1466640-bem-vindo-ao-trans-humanismo.shtml